Observatório JB traz nesta postagem comentários sobre observações e pesquisas realizadas a respeito da séria questão causada pela dissonância do comportamento de lideranças no processo de tomada de decisões e na sua ação efetiva. Ressalta a necessidade de consistência entre as palavras e as ações e alerta para os riscos que as empresas estão correndo. Com a recomendação de que momentos para análise e planejamento, como agora, são propícios para checar a real aplicação das estratégias de transformação previstas.
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Uma questão séria
Existe uma citação muito utilizada no meio empresarial global e cujo “espírito” diz respeito à medida de avaliação máxima para a consistência entre as palavras e as ações de um líder. Sugere, com uma imagem, o necessário alinhamento entre atitudes e palavras: "He walks as he talks".
Retomando o tema de nossa recente publicação e lembrando que a “lacuna saber-fazer” assola as empresas independentemente
do tamanho, setor ou natureza do negócio, vejamos alguns experimentos realizados
no meio empresarial e suas conclusões. E também alguns alertas.
Começando com um alerta: como a cada dia é mais crítica a efetividade na
gestão, está passando da hora em que os dirigentes das empresas devem tomar
alguma ação no sentido de mudar este quadro porque, conviver com um
comportamento corporativo, com muito discurso e pouca realização, é ilusório e
aumenta o risco de fracasso dos negócios. Alguns já ficaram pelo caminho...
Conclusões de experimentos de campo (que não são novos - alguns datam da década de 90 do século passado), mostram que pessoas são contratadas, promovidas ou designadas para cargos
cobiçados, muito frequentemente com base na sua capacidade de parecerem inteligentes e não necessariamente por competências que as levem a agir assertivamente ou por realizações
comprovadas.
Estudiosos preocupados
Uma das razões dadas por estudiosos para essa “epidemia”
é que muitos dirigentes em organizações contemporâneas passaram por
escolas de negócios e, mesmo aqueles que não têm MBA ou similar, frequentemente
participam em programas de educação executiva ministrados por essas escolas.
Aparentemente o que eles aprendem em sala de aula os
leva a entender ser de grande relevância parecer inteligentes nas discussões e escrever
coisas complexas nos exames e trabalhos escritos. A exposição a que são
submetidos sugere, ainda, que precisam apenas fornecer uma sugestão inteligente
- ou uma crítica sagaz sobre a proposta de outra pessoa - para impressionar
seus professores ou, generalizando, os seus pares e superiores.
Com tal jogo acadêmico, acabam incorporando o entendimento
de que, na vida real, não é preciso implementar transformações ou agir de
acordo com as decisões que surgem nas reuniões, porque um bom discurso é o bastante. E nessas condições chegam às empresas com um discurso bem articulado,
aparentemente inteligente e complexo.
Como agravante crescem dentro das empresas, no rastro desses, pessoas sem boa formação, sem conhecimento específico, sem a realização da
prática – porém espertas - que logo entendem que um discurso incorporando palavras
aparentemente inteligentes, pomposas e em evidência no momento é o que conta para alcançar seus
objetivos de maneira mais previsível do que agir ou estimular outras pessoas a
agirem.
Não seria verdadeiro dizer que a linguagem e conceitos complexos jamais agregam valor a uma organização. Mas há um limite prático.
Evidências
Em um experimento executivos foram solicitados a definir
alguns dos termos que usavam com frequência, como "organização que
aprende", "reengenharia de processos de negócios”, “teoria do caos” e
“paradigma”. Na maioria dos casos eles não conseguiram oferecer nenhuma
definição ou, quando deram alguma, foi terrivelmente vaga.
Se já é difícil o suficiente explicar como colocar
uma ideia complexa em prática quando ela é entendida, é obviamente impossível fazer
isso quando não se sabe do que está falando.
Tem tudo para não dar certo.
Os craques nessa performance, formados pelas escolas
de gestão ou não, foram identificados atuando prioritariamente como executivos,
líderes em geral ou em consultoria de gestão. O esmero com que cuidam das suas
imagens faz com que prevaleça a impressão de que a conversa tenha mais valor do
que deveria. Ou que, quanto mais uma pessoa fala mais capaz ela parece.
Outras pesquisas no meio empresarial demonstraram também
que pessoas que tomam a palavra com frequência têm mais probabilidade de serem julgadas
por outras como influentes e importantes. E falar pouco passa a ser um "pecado".
Em grandes corporações ou naquelas com estruturas complexas
este fato é exacerbado porque, como a direção não pode realmente saber em
detalhes o que cada pessoa efetivamente realizou ou é capaz e realizar, a avaliação
se dá com base em quão “inteligente” uma pessoa parece ser por meio do que diz em
reuniões de rotina, apresentações e conversas eventuais.
Outros estudos neste campo mostraram que algumas
pessoas falam mais do que outras para se destacar no "mercado de conversação"
de um grupo, o que alguns especialistas chamam de a “teoria da liderança
tagarela”. Por ela, falar com mais frequência e por
mais tempo - independentemente da qualidade de comentários – produz maior
probabilidade dessas pessoas emergirem como líderes de novos grupos, serem identificadas
como líderes pelos observadores do grupo, serem vistas como influentes por outros
grupos e estranhos, e terem maior influência nas decisões dos grupos em que participem.
A vida real
Contudo, ao compararmos a
educação em negócios com o treinamento que as pessoas recebem quando seu
desempenho é uma questão de vida ou morte a diferença salta aos olhos.
Soldados, pilotos e cirurgiões,
por exemplo, recebem treinamento em sala de aula, é claro, mas rapidamente passam
a aprender fazendo: os militares são exigidos a realizar as mesmas manobras que
serão necessárias durante os combates; os pilotos fazem voo simulado, mas em
seguida entram na cabine, decolam, fazem manobras e etc.
E as medidas pelas quais
são avaliados estão vinculadas ao resultado do que produzem em campo, não da
sua “conversa articulada".
Considerando que, no ambiente empresarial, há diversas atividades em que o desempenho passa perto de uma questão de "vida ou morte" corporativa, a adoção do exemplo deveria ser considerada.
Não se deve permitir que a conversa substitua a ação.
Exemplos
Observando todo este comportamento das lideranças
empresariais a mensagem que fica no ar é: “não se preocupe com suas
realizações, apenas certifique-se de que soa bem”. Nesse ambiente eles se
parabenizam mutuamente (e criticam no particular) quando apresentam ideias que
são tão elaboradas e complicadas que exigem horas de projeções
multicoloridas e uma sessão generosa com as últimas palavras da moda. E os executivos não apenas apimentam suas falas com linguagem empolada, mas também se agarram a conceitos mirabolantes e estratégias complexas com grande prazer.
A efetividade pode ser identificada quando, por exemplo:
- Um gestor (ou técnico) se coloca diante de seus colegas
para apresentar uma nova estratégia, com um mínimo de telas projetadas e ideias
que podem ser resumidas em poucas frases.
- Na presença de questionamentos, para checar se a pessoa que apresenta críticas tem conteúdo, a liderança solicita a essa pessoa para dar outra
solução ou propor formas de melhorar a proposta que está criticando.
Muito embora seja verdade que a vantagem competitiva
sustentável é construída fazendo coisas que são difíceis de imitar, estratégias
complexas não são as únicas difíceis de copiar. A facilidade de compreensão
nunca deve ser confundida com a facilidade de implementação.
Estratégias
“simples” de explicar podem ser difíceis de serem implementadas e imitadas.
Alguns conseguem evitar a armadilha da "conversa inteligente”.
Nessas empresas as pessoas sempre dizem coisas inteligentes e depois as fazem. São
empresas que praticam falar de maneira produtiva - para orientar e estimular a ação –
e têm líderes que priorizam o aprendizado e a execução do trabalho.
Em claro português: Os líderes que conhecem o trabalho
ou promovem sua execução, em vez de apenas falar sobre ele, ajudam a evitar que
exista a lacuna entre saber e fazer. E com isso desempenham um papel decisivo
na transformação do conhecimento em ação e nos resultados.
Diretivas
As lideranças podem e devem falar, o que pode ser bom
se leva à ação. Por isso não seria verdadeiro dizer que a linguagem e conceitos
complexos jamais agregam valor a uma organização. Mas o fato concreto é que as pesquisas
de especialistas confirmam algumas percepções de muitos que atuam no
ambiente corporativo:
- Performances verbais agregam
muito menos valor do que a maioria dos executivos considera.
- Não se deve permitir que a
conversa substitua a ação.
- Quando o discurso se torna um substituto
habitual do fazer, acionistas, clientes e funcionários pagam um alto preço - e
muitas vezes os próprios executivos também. O que pode se transformar em questão de vida ou morte.
Como o momento é de planejar 2022, em um ambiente de negócios cada vez mais sensível, uma boa recomendação para a análise dos resultados - principalmente daqueles que não ocorreram como previsto - pode ser observar até que ponto a existência dessa dissonância entre discurso e ação tem impacto na diferença entre o sucesso e o fracasso dos resultados previstos.
E implementar ações corretivas, é claro.
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